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O tempo, com 22 graus em novembro, não tem ajudado o negócio, até porque as castanhas sabem (e cheiram) melhor com mais frio. Agora, “sente-se só o fumo”, diz quem percebe do assunto. Mesmo assim, os assadores de castanhas mantêm viva a tradição que tem passado de geração em geração e que culmina no Dia de São Martinho, 11 de Novembro. Fomos conhecer três vendedoras, em zonas distintas da cidade, com mais turistas, onde até se diz castanha em japonês, ou com mais escritórios, onde a castanha está mais cara.
Ana Cristina Ferreira, 49 anos
Avenida Almirante Reis (saída de metro dos Anjos)
Preço da dúzia: 3 euros
Ana Cristina Ferreira nasceu no dia de São Martinho. Já estava “predestinada” ao negócio de família, que começou com uma banca na Praça Paiva Couceiro, não muito longe dali. Há 12 anos, conseguiu licença para vender na Avenida Almirante Reis, perto da saída de metro dos Anjos. É aí que a encontramos de outubro a abril a vender castanhas: 3 euros a dúzia, com uma ou duas de bónus para clientes habituais ou mais simpáticos.
O tempo quente não tem ajudado ao negócio e, nas horas mortas, Cristina costuma ler um romance. Por exemplo, “Uma Paixão”, de Danielle Steel, que guarda em cima da banca. “Com calor não apetece comer castanhas”, lamenta. Além disso, o cheiro a castanha não se propaga tanto pela cidade para atrair clientes. “Sente-se só o fumo.” No tempo dos seus pais, nos anos 80 e 90, vender castanhas era mais lucrativo. “As castanhas estão mais caras do que antigamente, agora é um bem de luxo. Antes comprávamos [ao fornecedor] a um valor que ainda compensava.”
Ainda assim, faz o que gosta e preocupa-se com um “bom serviço”. É por isso que, antes de dar o cartucho ao cliente, escolhe as castanhas, uma por uma, para ver se estão estragadas.
A Martaínha, variedade que costuma vender e que é um dos segredos do negócio, “atrai muito bicho”, explica, daí o cuidado extra, antes e depois de assar. “Esta não se vê em supermercados, vem da zona de Sernancelhe. Arde muito bem e é mais saborosa que as outras [variedades], que a Longal ou a Judia.”
O ponto da castanha no lume é fundamental. “Têm de ter todos o mesmo tamanho para assarem da mesma maneira”, continua. Quando a castanha “não vem calibrada” pelo fornecedor, escolhe as do mesmo tamanho para assar. Com a prática já consegue saber qual é o momento de retirá-las do assador, mas convém sempre “ir tocando”, aconselha, para “ver a textura”.
Maria da Assunção Pinto, 66 anos
Rua Augusta (em frente ao Elevador de Santa Justa)
Preço da dúzia: 3 euros
Maria da Assunção Pinto ou São das Castanhas, como é conhecida na Rua Augusta, está numa das ruas com mais turistas em Lisboa. É por isso que já aprendeu a dizer “castanha” em várias línguas: “Kuri, kuri”, repete, com um sorriso. “É japonês.”
Aos 16 anos, começou a trabalhar na venda ambulante. “Vendia artesanato no metro do Rossio”, conta. “Cheguei a ser hippie. Era o que se usava naquela altura. Vendia fios e pulseiras, mas também vendi cassetes e discos.”
Sem licença, era comum ter de fugir à polícia. “Não gostava de ficar enfiada numa loja”, confessa. “Quando estava grávida do meu filho mais novo é que começaram a dar licenças.”
Nessa altura foi para o negócio das castanhas na Baixa, “as melhores da Rua Augusta”, garante. Da variedade Martaínha, as castanhas vêm de Bragança e custam 3 euros a dúzia.
A brasa é um dos truques para garantir que fiquem mais saborosas, mas há outros. “É preciso pôr sal [sempre grosso, e em quantidades generosas] e ter as mãos próprias para ali”, diz, enquanto aponta para o assador. “São mãos de muitos anos.” Evitar queimaduras é uma das partes mais difíceis e São também nos mostra as mazelas do ofício que tem nos braços. Com 50 anos de experiência, poucas coisas mudaram na técnica de assar. Talvez só os cartuchos. “Dantes fazia com as Páginas Amarelas, agora faço com folhas do Euromilhões”, conta.
Em cima das castanhas por assar, tem um xis-ato, uma das suas ferramentas principais de trabalho. O corte na barriga das castanhas antes de assar é fundamental. É feito na horizontal na barriga da castanha e não pode ser demasiado profundo, para não a secar, nem demasiado superficial, para que asse toda por igual.
Lurdes Pinto, 63 anos
Rua Carlos Alberto da Mota Pinto (em frente ao Centro Comercial Amoreiras)
Preço da dúzia: 3.5 euros
“Quentinhas e boas. São da quinta da minha sogra”, apregoa Lurdes Pinto, a vender castanhas há quase 40 anos em frente ao Centro Comercial Amoreiras. Na verdade, vêm dia sim dia não de um fornecedor de Sernancelhe, mas o marketing é importante para o negócio.
As suas castanhas, também da variedade Martaínha, são das mais caras de Lisboa. “Não deve haver muitas assim a este preço. Mas a minha castanha é da boa e eles não têm desta”, orgulha-se. A zona da cidade, com muitos escritórios e pessoas de passagem, também inflaciona o preço.
Aos 12 anos, muito antes de estar nas Amoreiras, Lurdes vendia castanhas à porta do Cinema Império, na Alameda, “numa bicicleta a pedal”, conta. Agora, a sua banca vem atrelada a uma carrinha, estacionada todos os dias em frente à entrada principal do centro comercial, entre o meio-dia e as oito da noite.
Na família, os seis irmãos vendem castanhas nas ruas de Lisboa. No resto do ano, a partir da primavera, as castanhas são substituídas pela fruta da época, como os morangos e depois as cerejas.
Nos últimos dias, com mais calor, tem vendido castanhas de T-shirt e o negócio abrandou. “Tem estado fraco. Mas no dia de São Martinho costuma haver filas.” É a pensar nisso que tem um assistente para ajudá-la, sobretudo para cortar as castanhas, também com um xis-ato e um corte feito na horizontal.
“Se divulgarmos o segredo [das castanhas] não vamos vender”, diz Lurdes. “Mas assar em casa, no fogão, não tem nada a ver.”
Com carvão, e num assador com buracos, as castanhas ficam no ponto certo para irem para a gaveta, de onde são servidas depois para os clientes. Em casa, há quem as ponha de molho durante 30 minutos antes de assar. “Quem não conseguir tomar conta disto, do lume, não consegue pôr a castanha bem.”