Estabelecimentos gastronômicos mais procurados
Locais de interesse mais visitados
Desculpe, não há resultados para a sua pesquisa. Tente novamente!
Adicionar evento ao calendário
É um dia mais agitado do que o normal no Euskalduna Studio, no Porto. À noite, haverá um jantar a quatro mãos com o chef Pedro Sanchéz, do restaurante andaluz Bagá. A equipa de Vasco Coelho Santos, o anfitrião da noite, desdobra-se em tarefas atrás do balcão, com o chef e chef criativo Rui Silva e João Costa a liderar as operações. Há glorinhas da Confeitaria Nandinha pousadas numa mesa, não vá a inspiração precisar da ajuda de um docinho.
Vasco chega perto das 14h. Veste o avental, olha em volta e nem quer acreditar que o restaurante dos seus sonhos já tem 9 anos, «os mesmos que o meu filho mais velho». Naquele dia, ele irá dar serviço, mas desde há algum tempo para cá que essa deixou de ser a sua prioridade. Enquanto líder de um grupo que tem 8 projetos ligados à restauração, há muitas tarefas que lhe imploram por atenção.
«Enganam-se as pessoas que dizem que a restauração é um negócio fácil», desabafa com o pragmatismo de alguém que sabe que há decisões a tomar que vão muito além da mise en place. «Eu fervilho em ideias e acho que consigo pô-las a mexer, mas também se achar que não vale a pena bater mais no ceguinho, não tenho problema nenhum em abdicar delas».
Aos 37 anos, Vasco Coelho Santos coleciona algumas ideias das quais abdicou. Abdicou, por exemplo, da sua licenciatura em Gestão, para tirar um ano sabático. Na altura, não sabia cozinhar «nada» e achou que, se queria viver sozinho, pelo menos tinha que se desenvencilhar com os tachos. Inscreveu-se num curso de cozinha em Lisboa, no Atelier de Cozinha Michel, e aquilo que era para ser um «escape», tornou-se coisa séria. «Aí é que vem a piada».
Seguiram-se estágios, «uns atrás dos outros», incluindo dois anos nas cozinhas dos premiados Arzak e Mugaritz, no País Basco (região de onde foi buscar o nome Euskalduna), no icónico El Bulli, de Ferran Adrià, e outros dois anos no restaurante Pedro Lemos, no Porto. Até que veio o primeiro investimento: o BaixóPito abriu na baixa portuense em 2015, como chicken house.
«Foi a minha primeira experiência com um restaurante meu. Pensei numa proteína [frango], num preço barato e achei que tinha tudo para funcionar, mas não». Três anos volvidos, Vasco abdicou do BaixóPito. «Infelizmente custou-me dinheiro, tempo, energia, mas, de certa forma, fez com que hoje eu não tenha tanto medo de abrir projetos e de estar à frente deles».
Bem antes da experiência BaixóPito, já este chef, apaixonado pelo poker e pelo golf, patenteou o nome Euskalduna. Havia nele a vontade de ter o seu próprio fine dining, para além dos serviços de private cooking que ia fazendo por aí. Ao Japão, país onde passou dois meses, foi buscar o saber ancestral que está por trás de uma cozinha onde o método, a persistência e o respeito pelo produto na sua forma mais minimal levam à perfeição. A 7 de dezembro de 2016 abriu a sua própria omakase no Porto, o Euskalduna Studio.
«Vivi seis meses a dar muitos zeros», confidencia. O cenário viria a mudar quando o blog Flavors & Senses o distinguiu em 2017. «Todos os prémios são importantes, mas este foi talvez o que mais mudou o Euskalduna. A partir desse momento, começou a dar frutos».
Hoje, se há coisa que não falta a Vasco Coelho Santos são prémios de prestígio. Eles estão pelas paredes e prateleiras do restaurante, emoldurados discretamente no meio de livros e de muitos bonecos (uma fixação de longa data do chef) e arrumados em recantos especiais.
São esses recantos, como o dedicado a Maria de Lourdes Modesto, figura indispensável da gastronomia portuguesa, que mais enchem Vasco de vaidade. Numa fotografia de 2019, em que aparece em casa da autora de Cozinha Tradicional Portuguesa a servir-lhe umas Tripas à Moda do Porto, lê-se o seguinte comentário da própria: «as melhores tripas da minha vida». «Foi inesquecível», recorda o chef emocionado. Não há prémio que se sobreponha a tal elogio.
Maria de Lourdes, que até teve um jantar em sua honra no Euskalduna Studio, nunca chegou a ir ao restaurante de Vasco. Nunca lhe provou o Rabo de Boi, inspirado nos almoços de domingo da avó, nem a sua versão do doce algarvio Dom Rodrigo, pratos de uma primeira carta que, ao longo dos anos, foi mudando muito. «Fiz um crescimento de fine dining e comecei com um menu pequenino, de €70. Depois passou a €80, €95, €100, €115 e agora €145. Precisei de construir este caminho para o fazer robusto».
Se no início se servia Tainha e Raia no balcão verde mármore, onde desfilam pratos que encheriam de inspiração Giuseppe Arcimboldo, hoje há Lírio dos Açores e Cherne no menu de degustação. «Quero melhorar o Euskalduna Studio a toda a hora».
Ao mesmo tempo que Vasco vai aprimorando a sua jóia da coroa, vai deixando o seu nome inscrito noutros espaços que compõem o Grupo Euskalduna. «Quando fui para cozinha não era para estar 12 horas atrás de um restaurante, era para pensar e fazer restaurantes. Quero abrir espaços que me potenciem qualidade de vida e reformar-me quando já não aguentar este ritmo». Dormir 4 horas por dia, mesmo para alguém a quem a energia parece nunca falhar, deixa as suas mossas.
O Semea foi o primeiro restaurante a nascer dentro do grupo, em 2018. Viveu até à pandemia numa morada pequena do centro histórico do Porto, até se mudar para um edifício junto ao rio, no Cais das Pedras, onde a esplanada e a estação de fogo são os grandes chamarizes. A partilha dita o ritmo da refeição.
Seguiu-se a Peixaria, em 2021, uma loja-boutique surgida para «dar um utensílio aos restaurantes». O peixe, sazonal, seria trabalhado pela equipa liderada por Hélder Figueiredo e distribuído pelas cozinhas profissionais. «Não funcionou como achei que ia funcionar e hoje em dia estamos muito mais virados para o público final», refere Vasco. A lista de refeições pré-preparadas que podem ser levantadas na Peixaria varia ao sabor da estação, bem como os cortes de peixe prontos a cozinhar.
Já a Ogi, padaria artesanal de massa mãe que começou a funcionar como pop-up durante a pandemia e que desde 2022 tem uma loja física, rapidamente caiu no goto dos clientes e dos muitos restaurantes que ali se abastecem. Nesse mesmo ano, Vasco Coelho Santos expandiu o seu raio de ação para a região do Douro, abrindo na Quinta do Seixo um restaurante de matriz regional comandado pela chef Teresa Cruz.
O Kaigi, casa tipicamente nipónica chefiada por Nuno Brás, onde Portugal e Japão se encontram ao balcão, e o corner no Time Out Market, do Porto, focado num «casual dining bem executado», foram os dois últimos negócios a ver a luz do dia, em 2023 e 2024. Sabemos que há mais um projeto na calha, mas ainda sem data de abertura definida.
«Por agora estou bem», assegura o chef-empresário para quem o mais importante é manter a saúde financeira dos seus espaços, enquanto viaja pelo mundo «para pôr o Euskalduna lá fora». «Em dois meses fui a Madrid, ao Azerbaijão e a Itália, onde cozinhei com os 60 melhores chefs do mundo. É incrível!».
Vê-lo atrás do balcão do seu restaurante de sonho é mais raro agora do que nos primeiros três anos, nos quais só falhou cinco serviços. «Para mim é impensável, enquanto responsável pelo negócio e pelo restaurante, ter de o fechar por estar ausente. Se eu estiver na cidade, estou no Euskalduna. Quando não estou, estou a viajar pelo restaurante». A vida, diz-nos Vasco, é o restaurante. Se tiver de abdicar dele, que seja em grande.
Euskalduna Studio. Rua Santo Ildefonso 404, Porto. 935 335 301