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Miguel Dominguinhos e João Narigueta

Restaurante Poda em Montemor-o-Novo

Poda: cozinha alentejana, com tempero e afeto

11/03/2025

Texto: Filipa Vaz Teixeira

Fotografia: David Pires

Miguel Dominguinhos e João Narigueta recuperaram um restaurante icónico de Montemor-o-Novo para que os sabores de antigamente não fossem esquecidos.

Montemor-o-Novo tem um “microclima especial”. Quem o diz sabe bem do que fala. Miguel Dominguinhos, 28 anos, cresceu nesta vila alentejana a jogar futebol e à “caça ao homem” na rua. “Isto é uma aldeia grande onde ainda há muita proximidade entre as pessoas”. De pequeno, lembra-se nitidamente do Bar Alentejano, “um espaço mítico” que antes de ser restaurante, já lá vão mais de 40 anos, era um celeiro.

O Poda
O Poda ocupa o espaço do antigo Bar Alentejano, restaurante icónico de Montemor-o-Novo. A Sopa de Mogango, à direita, é um dos pratos que o chef João Narigueta trouxe das raízes alentejanas para a carta

O restaurante acabaria por fechar, sendo deixado ao deus-dará durante uma década, até que em janeiro de 2023 o proprietário se virou para Miguel e lhe disse que tinha “uma coisa muito boa” para lhe mostrar. A rusticidade do espaço, a ligação às raízes e a vontade de começar um projeto em nome próprio foi tudo o que precisou para deixar Lisboa e a Suíça, onde esteve emigrado, e voltar a Montemor-o-Novo. Começava, assim, a poda do Poda.

Os pratos do dia-a-dia do Escoural

“Na vinha, a «poda» é o que se faz para preparar as novas colheitas”, diz o também sommelier, que apanhou o gosto pelos vinhos num outro estabelecimento local, o Pátio dos Petiscos, onde iniciou o seu caminho na restauração. Aplicando o saber do campo ao seu restaurante, Miguel Dominguinhos recuperou o espaço tal e qual se recupera uma vinha velha: com delicadeza e respeito, para fazer sobressair o caráter de origem.

Primeiro, veio o restauro das madeiras antigas do balcão e dos cubículos onde ficam as mesas mais intimistas. Depois, foram acrescentados pormenores de bom gosto, como as cepas de vinha alinhadas numa parede, a dialogarem com as obras de arte e com o olhar do comensal. Por fim, veio a poda do receituário tradicional, trabalho que pedia dedo de especialista e para o qual Miguel chamou João Narigueta, do Híbrido, em Évora.

Elementos originaes
O Poda manteve muitos dos elementos originais do Bar Alentejano, nomeadamente as madeiras antigas, todas recuperadas
Dois Camponeros
Não só na carta se contam as tradições alentejanas. Também a decoração teve em conta elementos regionais. Aqui vêem-se dois camponeses, trajados com indumentária antiga

“Já estávamos em modo flirt há uns anos”, revela o chef de 34 anos, montemorense de gema, que tem uma ligação afetiva com este lugar: “Os meus pais casaram-se aqui”. Se já havia razões sentimentais para assumir o Poda, mais o desafio se tornou interessante quando João percebeu que esta era a oportunidade de praticar um tipo de cozinha diferente da de autor a que estava habituado a fazer no Híbrido e, anteriormente, no L'AND Vineyards, onde trabalhou com Miguel Laffan.

“Interessava-me ir buscar os pratos do dia a dia da cozinha alentejana, que vão muito além das carnes com migas e das sopas de tomate”. Trocando por miúdos, interessava-lhe recuperar as lembranças da aldeia do Escoural, onde passou grande parte da sua infância, e as receitas da sua avó Isabel, que tinha sempre um alguidar em cima do frigorífico com as carnes fritas da matança do porco ou com o cação, transportado por mercadores da costa até ali, entre camadas de feno, para suavizar o cheiro.

Migas Gatas
À esquerda: Miguel Dominguinhos e João Narigueta ao balcão. À direita: As Migas gatas, prato de aproveitamento de sobras de pão e de bacalhau, são um dos “bestsellers” da carta

“Falei com os meus pais, as minhas tias e o meu avô e recuei praticamente 100 anos, às coisas que eles e os meus bisavós comiam”, diz com rigor de antropólogo. Dessas conversas, trouxe para a carta do Poda pratos como o Coelho à São Cristóvão, a Sopa de Feijão com abóbora Mogango ou as Migas Gatas.

O primeiro fazia-se com sobras de coelho. “Era grelhado, temperado só com sal e depois levava um vinagrete de alho cru, coentros, azeite e vinagre”. É exatamente assim que ele vem para a mesa, bem desfiado, com espirros de colorau que lhe potenciam o sabor.

As migas, outro petisco de aproveitamentos, são o “bestseller” da casa e um dos poucos pratos constantes de uma carta em constante renovação. “No Escoural, a minha avó fazia-as com cavala ou com sarda curada ao sal”, recorda João, que para o Poda as reinterpretou com bacalhau, porque o fiel amigo é inegociável para o cliente portugu

Freijoada de bacalao
A Feijoada de Bacalhau cruza a gastronomia alentejana com a da região de Aveiro, de onde é natural a mãe de João Narigueta. É preparada com uma “base intensa de poejo”, revela João, que se lembra do avô fazer este prato na altura da Quaresma

Já a Sopa de Feijão com Mogango dá voz a uma das variedades de abóbora mais tradicionais das terras de Montemor, muito apreciada pela sua doçura e pela longevidade de conservação. É temperada com um piso de poejo, coentros e vinagre, ganhando uma acidez natural que lhe acrescenta em equilibro e prazer na boca.

Uma cozinha metediça no trabalho dos produtores

Mas a relação de João Narigueta com a gastronomia alentejana não vem só das memórias de família, das quais também resgatou a Feijoada de Bacalhau, indispensável na época da Quaresma. Vem do diálogo com os produtores, a quem pede catacuzes (espinafre silvestre com alto teor de ferro), feijões de vários tamanhos e feitios, como o catarino ou o carito (semelhante ao feijão frade, mas mais pequeno) e até chocolate fabricado a poucos quilómetros dali, na unidade do Melgão.

Louças artesanaes
Uma das próximas apostas do Poda serão as louças artesanais da ceramista Célia Macedo. Nas sobremesas, destaque para a Enxovalhada, bolo típico de Montemor-o-Novo, para a mousse de chocolate, feita com cacau da fábrica de Melgão, e para a laranja com azeite, mel e canela

“Trabalho com 14 produtores diferentes e 11 deles são biológicos”. A agricultura regenerativa é, para ele, uma prioridade e o planeamento da carta um exercício que, para ser sustentável, tem de ser feito para lá das portas do restaurante. “Houve um ano em que não tínhamos tomate. No ano seguinte, já havia excedente. Por isso é que é importante falar com os produtores. Gosto de me meter no trabalho deles”.

A David Duarte, produtor de carne bovina da Loja Cá da Terra, João compra línguas e rabos de vaca, matéria-prima que era preterida e que no Poda ganhou uma nova vida e é a estrela dos estufados. À padaria local Almodôvar e à Mó de Cima, do Esporão, vai buscar o pão, que chega à mesa num talego de retalhos. O azeite é da Mai Nova, as ervas aromáticas do projeto de agroflorestal Erva Brava e as leguminosas “da Dona Maria” [Horta do Zé], “do Pedro e da Inês” [Hortalmansor] e “da Susana”. Na sobremesa, destaque para a Enxovalhada da pastelaria Dona Queijada. “Este é mesmo um bolo de Montemor-o-Novo”, atesta João. É feito a partir de sobras de pão, banha, nozes e muita canela.

Já os vinhos são departamento de Miguel Dominguinhos. “É uma seleção de escanção”, diz o sócio-gerente, explicando que a oferta está dividida entre os vinhos locais e apontamentos de várias regiões nacionais e internacionais. Há uma opção de harmonização à carta (€25), que acompanha o menu de degustação de cinco momentos (€35).

Coelho especial
O Coelho à São Cristóvão é feito com sobras de coelho e é temperado com sal, vinagrete de alho cru, coentros, azeite, vinagre e colorau

Em breve, adianta Miguel, haverá uma harmonização não alcoólica, na qual as Infusões com História, marca ligada à Rota do Românico dos vales do Sousa, Tâmega e Douro, ocuparão um lugar central. “Temos muitas ideias para o futuro” e essas ideias, sabemos nós, incluem desenvolver um serviço de cerâmica artesanal em parceria com a ceramista Célia Macedo. A poda é para ir sendo feita, com passos bem medidos, para que a colheita nunca deixe de ser generosa.

Poda. Rua Sacadura Cabral, 25, Montemor-o-Novo. Quarta a domingo, 12h30-15h e 19h30-22h. 968 307 694. Preço médio: €35.